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Filósofos & Poetas

domingo, 25 de novembro de 2007

II
Das dúvidas de Locke sobre a alma
O autor do artigo Alma, da Enciclopédia, se guiou escrupulosamente pelas opiniões
de Jaquelet. Porém Jaquelet não nos ensina nada. Ataca a Locke, porque este
modestamente disse: «Quiçá não seremos nunca capazes de conhecer se um ser
material pensa ou não, pela razão de que nos é impossível descobrir por meio da
contemplação de nossas próprias idéias, se Deus teria concedido a qualquer
porção de matéria o poder de conhecer-se e de pensar; ou se uniu a matéria
desse modo preparada uma substância imaterial que pensa. Com relação a nossas
noções, não nos é difícil conceber que Deus pode, se assim lhe compraz,
acrescentar à idéia que temos da matéria, a faculdade de pensar; nem nos é difícil
compreender que possa agregar-lhe outra substância que possua tal faculdade;
porque ignoramos em que consiste o pensamento, e não sabemos tampouco a classe de substância a que o Ser Todo-Poderoso possa conceder esse poder, e que pode criar em virtude da vontade do Criador. Não encontro contradição em que Deus, ser pensante, eterno e todo poderoso, dote se quiser, de alguns graus de sentimento, de perfeição e de pensamento, a certas porções de matéria criada e insensível, e que nos una a ela quando crer conveniente». Como acabamos de ver, Locke fala como homem profundo, religioso e modesto. Pode se dizer que Locke criou a metafísica (assim como Newton criou a física) para conhecer a alma, suas idéias e suas afeções. Não estudou nos livros, porque estes poderiam dar instrução errônea; se contentou com se auto-estudar; e depois de contemplar-se longo tempo, no tratado do entendimento humano apresentou aos homens o espelho onde se havia contemplado. Em uma palavra, reduziu a metafísica ao que deve ser: na física experimental da alma. Conhecidos são os desgostos que lhe proporcionou o manifestar esta opinião, que em sua época pareceu atrevida. Porém era só a conseqüência da convicção que tinha da onipotência de Deus e da debilidade do homem. Não assegurou que a matéria pensa, porém disse que não sabemos bastante para demostrar que é impossível que Deus agregue o dom do pensamento ao ser desconhecido que chamamos matéria, depois de ter nos concedido o dom da gravitação e o dom do movimento, que não são igualmente incompreensíveis.
Locke não foi o único que iniciou esta opinião; indubitavelmente já o abordou antigüidade, posto que considerava a alma como uma matéria muito delicada, e por conseqüência, assegurava que a matéria podia sentir e pensar. Esta foi também a opinião de Gassendi, como se pode ver nas objeções que fez a Descartes: é verdade, diz Gassendi, que sabeis que pensais, porém não sabeis que espécie de substância sois. Portanto, ainda que seja conhecida a operação do pensamento, desconheces o principal de vossa essência, ignorando qual é a natureza dessa substância, da que o ato de pensar é uma das operações. nisso pareceis ao cego que, ao sentir o calor dos raios solares e sabendo que a causa é o sol, acreditara que teria idéia clara e distinta do que é esse astro, porque se lhe perguntarem que é o sol, poderia dizer: «É uma coisa que aquece». O mesmo Gassendi, em seu livro titulado Filosofia de Epicuro, repete algumas vezes que não há evidencia matemática da pura espiritualidade da alma.
Descartes, em uma das cartas que dirigiu a princesa palatina Elisabet, disse:
«Confesso que por meio da razão natural podemos fazer muitas conjeturas respeito ao alma, e acalentar algumas esperanças, porém não podemos ter nenhuma segurança». Neste caso, Descartes ataca em suas cartas o que afirma em seus livros.
Acabamos de ver que os pais da Igreja dos primeiros séculos, acreditando na alma
imortal, acreditavam-na ao mesmo tempo, material. Por isso diziam: «Deus a fez
pensante e pensante a conservará.”
Malebranche provou bastante bem que nós não adquirimos nenhuma idéia por nós mesmos, e que os objetos são incapazes de nos dar. Disto deduzo que provém de Deus. isto equivale a dizer que Deus é o autor de todas nossas idéias. Seu sistema forma um labirinto, no qual uma das veredas conduz ao sistema de Espinosa, outra ao estoicismo e a terceira ao caos.
Depois de disputar muito tempo sobre o espírito e sobre a matéria, acabamos sempre por não entender. Nenhum filósofo logrou levantar com suas próprias força o véu que a natureza tem estendido sobre os primeiros princípios das cosas. Enquanto eles disputam, a natureza obra.

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