CAPÍTULO XIV
Dos diversos modos de produzir o terror
e a compaixão
O terror e a compaixão podem nascer do espetáculo cênico, mas podem igualmente derivar do arranjo
dos fatos, o que é preferível e mostra maior habilidade no poeta.
2. Independentemente do espetáculo oferecido aos olhos, a fábula deve ser composta de tal maneira que o
público, ao ouvir os fatos que vão passando, sinta arrepios ou compaixão, como sente quem ouve a
fábula do Édipo.
3. Mas, para obter este resultado pela encenação, não se requer tanta arte e exige-se uma coregia
dispendiosa.
Arte Poética - Aristóteles
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4. Os autores que provocam, pelo espetáculo, não o terror, mas só a emoção perante o monstruoso, nada
têm em comum com a natureza da tragédia; pois pela tragédia não se deve produzir um prazer qualquer,
mas apenas o que é próprio dela.
5. Como o poeta deve nos proporcionar o prazer de sentir compaixão ou temor por meio de uma
imitação, é evidente que estas emoções devem ser suscitadas nos ânimos pelos fatos.
6. Examinemos, pois, entre os fatos, aqueles que aparentam a nós serem capazes de assustar ou de
inspirar dó. Necessariamente ações desta espécie devem produzir-se entre amigos ou inimigos, ou
indiferentes.
7. Se um inimigo mata outro, quer execute o ato ou o prepare, não há aí nada que mereça compaixão,
salvo o fato considerado em si mesmo;
8. o mesmo se diga de pessoas entre si estranhas.
9. Mas, quando os acontecimentos se produzem entre pessoas unidas por afeição, por exemplo, quando
um irmão mata o irmão, ou um filho o pai, ou a mãe o filho, ou um filho a mãe, ou está prestes a cometer
esse crime ou outro idêntico, casos como estes são os que devem ser discutidos.
10. Nas fábulas consagradas pela tradição, não é permitido introduzir alterações. Digo, por exemplo, que
Clitemnestra(43) deverá ser assassinada por Orestes, e Erífila por Alcméon,(44)
11. mas o poeta deve ter inventiva e utilizar, da melhor maneira possível, estes dados transmitidos pela
tradição. Vamos explicar mais claramente o que entendemos pelas palavras "da melhor maneira
possível".
12. Há casos em que a ação decorre, como nos poetas antigos, com personagens que sabem o que estão
fazendo, como a Medéia de Eurípedes, quando mata os próprios filhos;
13. Em outros casos, a personagem executa o ato sem saber que comete um crime, mas só mais tarde
toma conhecimento do seu laço de parentesco com a vítima, como, por exemplo, o Édipo de Sófocles. O
ato produz-se, ou fora do drama representado, ou no decurso da própria tragédia, como sucede com a
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ação de Alcméon, na tragédia de mesmo nome escrita por Astidamante, ou com a ação de Telégono no
Ulisses ferido(45),
14. Existe um terceiro caso: o que se prepara para cometer um ato irreparável, mas age por ignorância, e
reconhece o erro antes de agir. Além destes, não há outros casos possíveis;
15. forçosamente, o crime comete-se ou não se comete, com conhecimento de causa, ou por ignorância.
16. De todos estes casos, o pior é o do que sabe, prepara-se para executar o crime porém não o faz; é
repugnante, mas não trágico, porque o sofrimento está ausente; por isto ninguém trata semelhante caso, a
não ser muito raramente – como acontece,. por exemplo, na Antigona, no caso de Hémon com relação a
Creonte(46).
17. O segundo caso é o do ato executado.
18. É preferível que a personagem atue em estado de ignorância e que seja elucidada só depois de
praticado o ato; este perde o caráter repugnante e o reconhecimento produz um efeito de surpresa.
19. O último caso é o melhor, como o de Mérope em Cresfonte:(47) ela está para matar o próprio filho,
mas não o mata porque o reconhece; e também na Ifigênia, em que a irmã dispõe-se a matar o próprio
irmão; e na Hele.(48)
terça-feira, 20 de novembro de 2007
Dos diversos modos de produzir o terror
Postado por Poetray às 16:05
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